Filmes de terror com roteiros inquietantes e forte crítica social são a assinatura do cineasta Jordan Peele
Confesso que após ter assistido Corra!, primeiro trabalho do ator e cineasta Jordan Peele, fiquei impactado. E não foi à toa. Apesar de ser um grande fã de filmes de terror, percebi ali uma obra extremamente bem construída e longe dos velhos clichês sonolentos a que temos assistido nos últimos tempos. O filme foi o grande vencedor do Spirit Awards, prêmio do cinema independente americano, e Jordan ganhou como melhor diretor. Em 2018, na cerimônia do Oscar, esse favoritismo se confirmou: o filme garantiu a estatueta como melhor roteiro original.
Racismo e críticas sociais nos filmes de terror de Jordan Peele
Trazendo o racismo como ponto central, costurado por um envolvente terror psicológico, o filme conta a história do fotógrafo Chris, vivido pelo ator Daniel Kaluuya, um jovem negro que viaja para conhecer os pais de Rose, a namorada branca, rica e descolada vivida por Allison Williams. Aos poucos, ele começa a perceber o racismo velado demonstrado pelos sogros e, paralelamente, um crescente clima aterrador vai se formando. À medida que a trama lentamente se desenvolve, é possível observar como o racismo nos Estados Unidos pós-Obama é latente, ainda que com certo ‘’esforço’’ os personagens tentem se mostrar amigáveis. A tão aguardada revelação do filme não poderia ter sido mais original e, ainda que fantasiosa, não tira o brilho da obra, muito pelo contrário, é quase que um soco no estômago do espectador.
É por essas e outras que fiquei tão ansioso para a estreia de Nós e não me decepcionei. Protagonizado por Lupita Nyong’o, Winston Duke, Elisabeth Moss e Tim Heidecker, o filme retrata uma família americana em um típico final de semana em sua casa de veraneio. A paz é bruscamente quebrada quando estranhos tentam invadir o local. Roteiro clichê? Jamais! Os ‘’invasores’’ têm exatamente as mesmas aparências físicas da família.
Corra! e Nós
Ainda que muitos acreditem que Nós é um filme de terror menos político do que ´Corra!´, enxergo a crítica social retratada de forma ainda mais ampla e profunda. A começar pelo nome, que em um primeiro momento parece dizer pouco, mas diz muito. Em entrevista concedida ao podcast The Big Picture, Jordan Peele declarou: ‘’Estamos tão habituados a apontar para fora […] que precisamos investigar em nós mesmos e descobrir qual é a nossa parte em todo o mal.”
É daí que nasce esse constante ‘’chamamento’’ presente no filme, que na verdade nada mais é do que o retrato da incapacidade que temos de enxergar nossos privilégios em uma sociedade que segrega e vive na luz em razão das minorias destinadas a viver nas sombras.
Mas obviamente que isso é só o começo, o filme faz ainda analogias importantes, como por exemplo, o movimento Hands Across America (1986), uma iniciativa do governo americano para mobilizar doações para instituições de caridade, considerado um grande fracasso na época.
É claro que eu poderia ficar aqui escrevendo horas e horas sobre esses dois excelentes filme de terror (que vão muito além disso), mas destaco uma das minhas referências prediletas: a cor vermelha do figurino dos vilões faz uma alusão aos republicanos, a direita norte-americana. Quem serão as verdadeiras vítimas então?
Espero que você tenha bons motivos para assistir aos dois filmes e não deixe de dividir com a gente o que você achou.
Até mais.